esses que fuçam nas cocheiras

Maio 15th, 2012

(www.pliniomarcos.com)

Quem me interessa é a patota que se embala e se agarra nas coisas com unhas e dentes. Esses que fuçam nas cocheiras. Que fazem das tripas coração pra discutir uma partida de futebol. E apesar de tudo, agradecem aos seus orixás por estarem vivos. Amam até as últimas consequências. matam e morrem por um amor contrariado. Porém, nunca recusam o amor, nem curtem a fossa.

Plínio Marcos

in “Quem conta um conto…”, Última Hora, 18/01/1972

 

talento e ira

Maio 14th, 2012

Plínio Marcos (www.pliniomarcos.com)

De todas as peças que analisaram a situação brasileira pós-1964, O Abajur Lilás se distingue certamente como a mais incisiva, dura e violenta. Plínio Marcos fundiu nela, mais do que em outras obras-primas, talento e ira. (…)

O Abajur Lilás existe como vigoroso documento humano, sem falsificações de nenhuma espécie. Plínio não sucumbiu ao lugar-comum de pintar uma prostituta boazinha, vítima da sociedade. Na áspera luta pela sobrevivência, elas se trucidam tanto quanto desejam ver-se livres do explorador. O texto contém a amarga realidade dos seres que se agitam na imanência, distantes de uma vida transcendente. Agudo diagnóstico de um dramaturgo que se intitula “repórter de um tempo mau”.

Sábato Magaldi

in O Estado de São Paulo, 19/07/1980

“O Abajur Lilás”: peça contra o poder ilegítimo, escrita num português amplo

Maio 14th, 2012

Estreia esta quarta-feira em Coimbra, no Teatro da Cerca de São Bernardo, “O Abajur Lilás”, de Plínio Marcos. O espectáculo é uma co-produção entre A Escola da Noite e o Cendrev e tem encenação de António Augusto Barros, cenografia de João Mendes Ribeiro e Luisa Bebiano e um elenco misto, com actores das duas companhias. Depois da temporada inicial na cidade alentejana, chega agora a Coimbra para uma série de 11 espectáculos.

 

Três prostitutas partilham o quarto onde vivem e trabalham. O proprietário do prostíbulo exerce pressão sobre elas para que aumentem a produtividade, socorrendo-se sempre que necessário de Osvaldo, o seu capanga.
Considerada como a mais incisiva das peças que analisaram a situação brasileira durante a ditadura que se seguiu ao golpe de Estado de 1964, “O Abajur Lilás” foi escrita (e proibida pela primeira vez) em 1969. Em 1975, depois de uma segunda proibição, viria mesmo a tornar-se uma bandeira em defesa da liberdade de expressão e contra as diferentes formas de opressão e exploração. Ela servia, nas palavras do crítico brasileiro Sábato Magaldi, “de desnudamento de um período de terror”. O mesmo autor salienta, no entanto, a universalidade e a intemporalidade do tema que, metaforicamente, percorre toda a obra: “O Abajur Lilás” é “um contundente veredicto contra o poder ilegítimo”.

Um português amplo
Tal como todas as outras peças de Plínio Marcos, “O Abajur Lilás” está escrito numa linguagem marginal e carregado da gíria específica de Santos (São Paulo), de onde o autor era natural.
Propositadamente, a versão apresentada pelo Cendrev e pel’A Escola da Noite respeita o texto original praticamente na íntegra. Por um lado, porque seria impossível fazer uma adaptação ao “português de Portugal” sem afectar a estrutura original da peça; por outro lado, porque este português amplo oferece ao espectador um surpreendente conjunto de palavras e expressões pouco utilizadas na linguagem do dia a dia mas que fazem parte da diversidade e da riqueza da língua portuguesa, que demasiadas vezes permanecem esquecidas.

Esta co-produção
O Cendrev (fundado em 1975) e A Escola da Noite (fundada em 1992) pertencem a duas “vagas” distintas da descentralização artística em Portugal e mantêm há muito relações de colaboração e intercâmbio. “O Abajur Lilás” é a primeira co-produção entre os dois grupos. Depois da estreia e da temporada em Évora, em Abril, o espectáculo chega agora a Coimbra. Está em cena no Teatro da Cerca de São Bernardo entre 16 e 27 de Maio, de terça a sábado às 21h30 e aos domingos às 16h00.

O Abajur Lilás
de Plínio Marcos

encenação António Augusto Barros
interpretação Ana Meira, José Russo e Rosário Gonzaga (Cendrev) e Maria João Robalo e Miguel Lança (A Escola da Noite) cenografia João Mendes Ribeiro e Luisa Bebiano figurinos Ana Rosa Assunção desenho de luz António Rebocho banda sonora André Penas

Coimbra, Teatro da Cerca de São Bernardo
16 a 27 de Maio
terça a sábado, 21h30; domingos, 16h00
M/16 > 1h40 com intervalo > 5 a 10 €
informações e reservas: 239 718 238 / geral@aescoladanoite.pt

Bendito é o sonho, maldita a censura

Maio 13th, 2012

ainda que pareça mentira

Maio 13th, 2012

O CARAMÁ

Ladrão mal encarado, como o próprio nome indica. De mal com a justiça e com a sorte, leva a vida o melhor que pode, sobretudo à custa dos turistas. Anda muito, rouba tudo o que encontra no caminho e dorme onde a noite o apanha. Assenta a sua actividade delinquente numa capacidade inata para convencer as pessoas, mas cuidado! É cobarde e traiçoeiro e até pode ser que acabe os seus dias como ministro de algum país sul-americano. Outras características: é alérgico às flores, sobretudo aos jasmins, e fuma tabaco rubio (quando pode, claro).

 

A WINSTON

Travesti anafado e cinquentão, dono de um carrinho ambulante de venda de tabaco, balões, bolinhas e outras bugigangas de consumo rápido. Deu muito que falar no seu tempo mas agora não tem outro remédio a não ser falar dos outros pelas esquinas da noite. Como qualquer boa mariquita sevilhana talhada à antiga, alimenta uma verdadeira paixão pela Virgem, principalmente na Semana Santa e no Rocío, tão forte que lhe custará a vida. Ainda não sabe o que é a SIDA e não se lhe conhecem outros vícios para além dos que são próprios do seu sexo.

A acção, ainda que pareça mentira, passa-se em Sevilha e nos dias de hoje.

 

“Santíssima Apunhalada”, de Antonio Onetti, estreia no TCSB no próximo dia 22 para uma curta temporada de seis sessões, sempre às 19h00.

imagem: Sevilha na Semana Santa. Retirada daqui.