[…] Apetece-me dizer que o espectador deixa de poder ver o tema, de atender apenas à palavra e ao gesto como produtores de uma certa ideia das pessoas e dos sentimentos que as animam, para passar a assistir a uma espécie de competição extremada do artista consigo mesmo. O espectáculo, de construção dramática, passa de certo modo à categoria de ultrapassagem emocional na qual o espectador sai esmagadoramente vencido pela extenuante energia posta em marcha pela actuação solista.
Devastado pelo talento evidente, o espectador rende-se. Mas será que fica convencido ao nível do exercício quotidiano do pensamento sensível? Será que da imensa energia dispendida e do elenco de recursos histriónicos, da ciência do dizer e da capacidade da construção gestual sobra alguma coisa para seu próprio consumo íntimo? […]
“Reflexão em torno do monólogo coisa pública”, Costa Brites in Diário de Coimbra [9 de Março de 2010]