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diário do festival (1)

Quarta-feira, Junho 6th, 2012

Festejar o quê – recomendaria o bom senso que nos perguntássemos – se invariavelmente, logo depois dos primeiros abraços, desatamos a contar misérias, a confrontar estreitezas de horizontes, a comparar as extensões dos danos do que nos estão a fazer.

E no entanto festejamos. O estarmos vivos, como dizia o Bruce Springsteen no domingo passado. E o termos sabido – acrescentamos nós – construir esta comunidade teatral que gosta de se juntar e de assim se mostrar ao público, nas suas diferenças, contradições e complementaridades.

É verdade que esta edição do Festival começa com um sabor muito mais amargo do que as anteriores. Que sofremos com os despedimentos que já tivemos de fazer, que ainda andamos a fazer contas e a inventar soluções para chegar até ao final do ano e que nos angustia esta incerteza face ao futuro próximo. Que nos ofende a inutilidade arrogante das instituições públicas que deviam assegurar, em parceria com os artistas nacionais, o acesso de toda a população a todas as formas de expressão artística.

Mas não desistimos. E hoje, ainda a CTB não tinha subido ao palco para oficialmente abrir o V Festival das Companhias da Descentralização, já se falava do sexto, com o Vereador da Cultura da Câmara Municipal da Covilhã.

Festejar o teatro é também isto – inventar luzes onde e quando apenas nos querem condenar às trevas. Por isso aqui estamos, seis companhias e mais de 50 profissionais de teatro, na premiada Évora, perante a indiferença da autarquia mas recebidos de braços abertos pelo Cendrev e pelo público da cidade.

Estamos em festa e a vivê-la (manda o bom senso) como se fosse a última.

Esta já ninguém vos tira!

 Pedro Rodrigues,

Évora, 5 de Junho de 2012

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Rui Madeira: “quero ir preso”

Terça-feira, Junho 5th, 2012

Texto de Rui Madeira, director artístico da Companhia de Teatro de Braga, publicado no n.º 3 do Jornal das Companhias.

O primeiro espectáculo do Festival é já daqui a pouco, no Teatro Garcia de Resende.

Rui Madeira (foto: Augusto Baptista)

Tenho uma página em branco. E sinto a barba a crescer”*

Cresci no teatro e na vida ensaiando sempre a participação na coisa pública. Aprendi com Gérard Philipe e Jean Vilar, com Strehler e tantos outros que deram e dão testemunho do seu empenho enquanto criadores, afirmando as suas estruturas artísticas e o seu labor criativo exactamente na medida da leitura que fazem do “estado das coisas”. Embora reconheça que na última década se acentuou a ideia que os artistas querem-se artistas e pronto. E que o importante é a exploração artística do Eu. E que esse olhar introspectivo integra aquele outro olhar para fora, que gera afinal a tal atitude criativa esperada e logo suficiente. Sempre me tenho mantido fiel à premissa que ao artista, pelo caracter público do seu mester, cabe intervir enquanto tal na discussão da Cidade.É verdade que nos últimos tempos, no que resta de arremedos críticos e opiniões de amigos de amigos a quem se trocam uns espacinhos nos jornais, e sobretudo nas conversinhas mansas mais ou menos ameaçadoras dos usuários do poder, outras vezes até no debate de ideias que aqui e ali pouco acontece, e muito nos responsáveis dos partidos políticos , lá se vislumbra a ideiazinha fosforescente de que os artistas só são úteis para assinar apelo comissão de honra apoios muito importantes e urgentes… para no tempo seguinte serem os mesmos sempre a criticar apesar “do dinheiro que lhes tem sido dado”.

É aqui que quero chegar. Ao tempo que vivemos. E partilhar algumas das minhas perplexidades. Assim numa espécie de comentador de mim mesmo, exercício perigoso num país em que os Comentadores assumem a mediação do Discurso, reinventando-o reinterpretando-o tornando-o Novo Seu qual crítico da Arte que assumindo-se a um tempo artista e público numa penada prescindiu de facto do artista que no fundo abomina e inveja gerindo ele mesmo o discurso isto é o Negócio qual programador encartolado relegando o artista e a Arte para a posição onde nos encontramos hoje: fora da sociedade e sem direito à Palavra. Fora do mercado e sem possibilidade de circular. Comento-me então:

Digo: Durmo  bem! Pouco é certo, mas bem e seguido?

O que eu quero dizer  é que apesar de a Companhia que ajudei a fundar há 32 anos e que dirijo não conseguir pagar os salários nem fazer face aos compromissos mais imediatos de lutar há 3 anos para não mandar para o desemprego pessoas que sempre viram ser-lhes roubado o direito de estatuto profissional e respectivas regalias sociais , apesar de ter cumprido sempre e às vezes em excesso a sua parte em consecutivos contratos com o Estado e da recíproca ser intermitente apesar das lutas  contra os sucessivos responsáveis do sector apesar das ameaças concretizadas e dos cortes irracionais e vingativos apesar dos lobies  das invejazinhas das sacanices durmo bem. E de consciência tranquila. Sei no fim de cada dia que fiz  tudo o que devia ter feito para conseguir. Dei o melhor e obriguei os que comigo trabalham a fazer o mesmo. O nada. Para lá do prazer do nosso trabalho.

Digo e convenço-me: trabalho mais hoje do que há 20 anos tenho menos dinheiro e estou feliz.

O que quero mesmo dizer é que sigo à risca as máximas do nosso primeiro: trabalho  muito mais como ele quer ganho muito menos como ele impôs não vivo atormentado com o espectro do meu desemprego e dos que comigo trabalham porque sei que isso quando acontecer e vai acontecer é uma oportunidade ímpar para finalmente emigrar. Depois de escutar o nosso primeiro sei que posso virar empresário eu mais as cerca de 50 pessoas que trabalham no Teatro Circo e na CTB. E se formos mesmo bons e modernos e liberaisaté podemos empregar pessoas e exportar coisas. Quero portanto reafirmar que estou feliz porque não sou piegas  sou fino como o nosso primeiro quer. Sei que estou a contribuir para o crescimento do país para a sua liquidação isto é para acabar de vez com a dúvida desculpem dívida.

Digo que não me apetece escrever nenhum texto para o Jornal das Companhias nem preencher formulários de candidatura nem da internacionalização da DGArtes nem das Comemorações Portugal/Brasil nem para financiamentos QREN nem pedir renegociação das dívidas à Segurança Social nem aos bancos nem aos credores nem pagar impostos nem a renda da casa nem água electricidade gás automóvel seguros internet. Nada! Nem fazer relatórios nem ter cartão de cidadão nem cartões de desconto nem cartões nem cartas. Só me apetece trabalhar pronto!

Acham exótico? Para mim é a consequência lógica do espiritismo em que me encontro resultante deste estado patrão que finalmente desarrincou alguém com vocação para mandar. Pôr ordem nisto. As Finanças em Ordem. Há tantos anos que vivia com Saudades dum ministro assim. E gosto de tudo do ar do sorriso do ritmo da fala do tom. E sinto-me muito mais feliz e ágil. Temos homem e também gosto da Maria dele embora seja mais espevitadota e cante ópera.  Sim porque a Coelho chama-se assim a maria deste já disse que a Cultura e a criação artística é de importância tão tão estratégica que o Governo não se quer imiscuir que deve ser a sociedade a libertar essas energias criativas diz ele que a Cultura não é de esquerda nem de direita é de todos e como ele é um bocadinho de direita não se mete faz muito bem porque poupamos dinheiro que é preciso pró país. E quando emigrarmos todos e não houver quem faça o amor e os meninos e os velhinhos ficarem por aí a arrastar os pés sem saber ler sem transportes nem consultas nem reformas nem comida é que isto vai ficar bom. O que eu tento explicar é que para lá de não me apetecer escrever também já deixei de pensar.. Acabou. Sei que o Governo pensa quer e faz por mim e contra mim. Estou tranquilo. Abrevio. Quero ir preso. Espero a chegada desses grandes magos, gaspar, viegas & passos verdadeiros reis do meu pobre imaginário venham buscar-me quando quiserem acendam lá a almotolia. Não hesitem e ajudem-me. Sabem onde estou e se não souberem o Relvas sabe.

PS. Agora me lembro pediram-me um texto sobre o teatro para o jornal das companhias. Mas isso existe? Teatro? Companhias? Vocês vivem em que século? Dou-vos um conselho: vão reunir-se em Évora não vão? Pois sim alcem para um descampado levem farnel façam um pic-nic debaixo dum chaparro como os burgueses do poeta e tratem de se organizar e vão escolhendo o sítio cavacando as covas… em coro! É mais divertido que essa porra do teatro seus comunistas de merda. Ah! Ah! Espectáculos debates jornais cinco dias. Festas? Tá bem tá! O Coelho é que vos quer à perna! Estão fodidos comigo. Lembram-se do Duarte Lima? Esse exímio instrumentista de órgãos de igrejas? Pois vou meter a boca no trombone e contar tudo ao Viegas.

Rui Madeira,

a 24 de Maio num avião da TAAG, algures por cima do Burkina Faso,

(faço o que posso) a caminho do exílio e duma vida melhor.

*extracto dum poema canção de Jorge Palma

Évora: Festival abre com Jardim de Schipenko

Terça-feira, Junho 5th, 2012

Uma visão muito particular da história de Inês de Castro abre hoje o V Festival das Companhias. “Jardim”, pela Companhia de Teatro de Braga, sobe ao palco do Garcia de Resende às 21h30. Apareça!

"Jardim", Companhia de Teatro de Braga (foto: Paulo Nogueira)

5 de Junho, terça-feira, 21h30

Teatro Garcia de Resende, Sala Principal

Jardim

Companhia de Teatro de Braga

 

Esta é uma história muito conhecida em Portugal e, no nosso espectáculo, é contada de uma maneira diferente – talvez como diário de Inês de Castro.

Neste diário ela descreve o seu primeiro encontro, o amor, a vida com Pedro, e o seu assassinato. Contudo, o seu diário continua para lá da sua morte. Até à exumação do seu corpo e coroação como rainha de Portugal, Inês relata o que acontece com aqueles que permanecem vivos.

O objectivo de “Jardim” é criar a imortalidade do amor (…). [Um] espectáculo único, para glória e espírito da cultura portuguesa.

Alexej Schipenko

 

autoria e encenação Alexej Schipenko tradução António Pescada interpretação André Laires, Carlos Feio, Frederico Bustorff Madeira, Jaime Monsanto, João Chelo, Rogério Boane, Rui Madeira, Solange Sá, Thamara Thais cenografia e figurinos Samuel Hof desenho de luz Fred Rompante criação vídeo Frederico Bustorff Madeira criação sonora Luís Lopes

M/16 > 1h40

Antes que seja tarde

Segunda-feira, Junho 4th, 2012

Sai amanhã o número 3 do Jornal das Companhias. Pré-publicamos o editorial, em nome três teatros que fazem a Culturbe.

ANTES QUE SEJA TARDE

A rede Culturbe faz dois anos. Até ao final de Maio de 2012, circularam pelas três cidades 10 companhias nacionais e internacionais e quase 30 espectáculos de teatro e dança vistos por mais de 6 mil espectadores. Foram organizadas várias oficinas para mais de 500 formandos, nas áreas da dramaturgia, da interpretação, da manipulação de marionetas e de movimento.

Até ao final do ano (e, desejavelmente, também em 2013), esta rede abarcará ainda mais companhias, espectáculos e acções de formação, prosseguindo a sua missão de complemento à programação dos três teatros municipais com companhia residente que a compõem.

Dois anos depois, a Culturbe volta a proporcionar ao público um momento de festa, com o Festival das Companhias da Descentralização, uma das linhas essenciais do seu programa. Serão cinco dias de intensa actividade, com a presença de seis companhias de teatro e a apresentação de sete espectáculos distintos, tendo como sede o Teatro Garcia de Resende, em Évora. É uma boa forma de celebrarmos, com o público e com os artistas, a passagem deste aniversário.

O festival devia ter sido realizado em 2011. Incompreensíveis atrasos na formalização dos contratos de financiamento da rede (no âmbito do QREN) inviabilizaram essa possibilidade e têm condicionado a programação. Ao fim de dois anos, e com toda esta actividade realizada, nenhum dos três teatros recebeu ainda qualquer parcela da comparticipação atribuída.

Se num contexto normal isso já seria grave, na situação actual é verdadeiramente calamitoso. Com as variantes decorrentes dos contextos jurídicos, políticos e institucionais de cada Teatro, o cerco aperta-se por todos os lados – lei dos compromissos, cortes no financiamento da Direcção-Geral das Artes, aumento do IVA, quebra generalizada das verbas de patrocínio e mecenato e, à excepção de Braga, atrasos no pagamento das autarquias.

As redes de programação como a Culturbe, financiadas por programas comunitários, foram criadas para potenciar o trabalho de estruturas que supostamente teriam uma estabilidade mínima. Face à drástica redução dos orçamentos próprios dos teatros públicos, elas converteram-se entretanto numa espécie de bóia de salvação, que ajudava a disfarçar o desinvestimento estatal. Hoje em dia, com estes atrasos, elas transformaram-se num problema adicional com que os teatros têm de lidar, agravando a sua já muito débil sustentabilidade financeira.

Neste caso, não colhe sequer o argumento da crise ou da “austeridade necessária”. Pelo contrário, o dinheiro vem “de fora” e em nada onera as contas do Estado. Ele poderia e deveria estar a ser usado para dinamizar o sector.

É importante dizer que a Administração Central não investe neste momento dinheiro nenhum no funcionamento e na programação dos teatros públicos espalhados pelo país. O que está a ser feito acontece graças ao investimento das autarquias ou ao que as companhias residentes retiram ao seu próprio orçamento para os colocar a funcionar. Os fundos comunitários são obviamente uma boa solução para evitar que o país retroceda 20 anos, ao tempo em que nem as capitais de distrito tinham salas de espectáculo a funcionar. E não têm de custar dinheiro ao Estado – exigem apenas agilização de procedimentos e, na falta de meios próprios, a definição de políticas que consigam aproveitar a capacidade instalada no terreno e potenciá-la com os recursos externos captados.

Em tempo de crise generalizada, os teatros estão à beira do colapso. Queremos evitá-lo e queremos discutir o assunto, acreditando que é ainda possível encontrar soluções.

É também para isso que se faz este festival. Antes que seja tarde.

A Escola da Noite / TCSB

Centro Dramático de Évora / TGR

Theatro Circo de Braga

V Festival das Companhias: o programa completo

Segunda-feira, Junho 4th, 2012

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