Se não fosse por mais nada, o VATe – Serviço Educativo da ACTA distinguir-se-ia pela forma como se apresenta e faz transportar: num autocarro transformado em teatro que anda há anos a encantar miúdos e graúdos pelas terras algarvias. Por estes dias, está estacionado ao lado do Teatro Garcia de Resende. As portas foram abertas ao público de Évora pela primeira vez hoje de manhã, com uma sessão da peça “A mais louca história da aviação”, para cerca de meia centena de alunos do pré-escolar e do primeiro ciclo.
Independentemente do nome que cada uma lhes dá, o VATe é o mais exuberante exemplo de um conjunto de actividades desenvolvidas por várias companhias de teatro (incluindo todas as que participam neste festival), visando o alargamento e a formação de públicos: acções de formação para alunos, para professores, para alunos e professores, para grupos de amadores, para estudantes universitários, para o público em geral; leituras; visitas guiadas; conversas com os artistas; conferências e debates; ciclos de cinema; intervenções na rua e em espaços não convencionais (o espectáculo da ACTA estreou junto aos balcões do check-in do aeroporto de Faro); documentários; edições.
Fazem-no há muitos anos. Por interesse próprio e por interesse público, num país cuja taxa de analfabetismo ronda os 10% e onde ir ao teatro ou ler um livro são extravagâncias na vida da vida da maior parte dos cidadãos.
Têm-no feito sem o apoio do Estado, que se limita a incluir estas actividades (cada vez mais) entre as contrapartidas obrigatórias pelos apoios que dá (cada vez menos) à criação artística. Pior: têm-no feito contra o discurso e a prática dominantes nas instituições públicas, que não só não fazem o que lhes compete nesta matéria (na articulação com o Ministério da Educação, por exemplo), como objectivamente afastam públicos das salas de teatro de cada vez que insinuam, acusam ou deixam que se acuse aqueles que financiam de serem subsidiodependentes ou “mendigos de chapéu na mão”. Que adiantam a retórica oficial sobre a importantíssima relevância da cultura, os prémios e as honras balofas em dias de festa quando o Estado que os atribui é o mesmo que viola contratos assinados, aplicando cortes de 40% em financiamentos atribuídos e que nada diz sobre o que pretende fazer daqui a seis meses, deixando paralisadas e agonizantes dezenas de estruturas profissionais? Como pode o Estado querer que os cidadãos se importem com a criação artística se ele a espezinha desta maneira?
E, no entanto, a responsabilidade continua a cair sobre nós. Se não temos públicos suficientes nem dispostos a pagar os custos da nossa actividade, o problema é nosso, que não sabemos cativá-los.
Seria demagógico, irresponsável, improdutivo e (em alguns casos) injusto referir aqui as taxas de abstenção nas eleições que legitimaram o poder dos governantes que assim pensam e agem.
Não o faço a sério, portanto. É apenas para responder à letra.
Pedro Rodrigues
Évora, 8 de Junho de 2012