Obra censurada de Plínio Marcos estreia em Évora

A Escola da Noite e o Centro Dramático de Évora (Cendrev) estreiam no próximo dia 19 de Abril, no Teatro Garcia de Resende, “O Abajur Lilás”, de Plínio Marcos. Escrito num português amplo, o texto é uma poderosa metáfora das diferentes formas de reagir em contextos de opressão.

Dilma, Célia e Leninha são três prostitutas que partilham o quarto onde vivem e trabalham. Giro, o proprietário, acha que elas são pouco produtivas e exerce sobre elas as formas de pressão e de motivação que conhece, com a ajuda de Osvaldo, uma espécie de secretário musculado. As relações entre as cinco personagens evoluem tragicamente a partir do momento em que se quebra o abajur que iluminava o quarto. A linguagem utilizada (o calão da cidade de Santos, São Paulo, de onde Plínio é natural) e a alegada obscenidade do texto foram os argumentos avançados pela censura brasileira para, por duas vezes, proibir a estreia do espectáculo. Em 1975, a proibição gerou fortes reacções por parte da comunidade artística, que se solidarizou com Plínio: “o calão das suas personagens e a crueza das situações que denuncia são tão chocantes quanto a realidade que elas espelham. É mister não proibir obras como a deste autor, mas ter a coragem de encená-las como remédio amargo que deve tomar um organismo para manter-se sadio”, dizia-se num comunicado da Associação dos Críticos de Arte de São Paulo.

Plínio Marcos (1935-1999) ironizava com a situação e com o facto de ter vários textos seus proibidos: “foi sempre por merecimento, eu nunca fiz nada para agradar às pessoas”. O desafio aos censores e ao poder instituído é bem mais profundo, no entanto, do que a mera utilização de uma linguagem popular ou a apresentação de situações de miséria material e humana. Em “O Abajur Lilás”, dentro das paredes apertadas de um quarto de prostíbulo, encontramos a história intemporal da opressão entre indivíduos e das diferentes formas, sempre complexas e multifacetadas, que estes encontram para lidar com ela – individualismo, pragmatismo, revolta, negação, esperança, desespero.

Numa sociedade em que a violência física e verbal está difundida e banalizada até ao ponto da indiferença, é essa profundidade da obra de Plínio que mais toca, quase 40 anos depois da sua escrita. Nenhuma censura consegue pôr cobro a essa reflexão; nenhuma forma de opressão – política, social ou económica, mais assumida ou mais nebulosa – lhe escapa.

O Cendrev e A Escola da Noite

Dirigido por António Augusto Barros, o espectáculo é a primeira co-produção entre o Centro Dramático de Évora (Cendrev) e A Escola da Noite – Grupo de Teatro de Coimbra, duas companhias com idades e percursos diferenciados, mas que há muito colaboram e mantêm relações de intercâmbio. Em comum, para além da aposta na descentralização e da missão de serviço público que assumem como sua nas cidades que escolheram como sede, os dois grupos apresentam reportórios eclécticos e demonstram, pela sua prática continuada, a importância da existência de estruturas de criação artística com um mínimo de sustentabilidade espalhadas pelo território nacional.

O elenco e a restante equipa técnica e criativa integram elementos das duas companhias, num processo que tira o melhor partido das valências e dos recursos de cada uma delas. “O Abajur Lilás” está a ser preparado e estreará na histórica sala do Teatro Garcia de Resende, em Évora, que cumpre, em 2012, 120 anos de existência. Parte depois para o Teatro da Cerca de São Bernardo, em Coimbra, e para outros prostíbulos – perdão, teatros – portugueses na segunda quinzena de Maio.

O Abajur Lilás

de Plínio Marcos

encenação António Augusto Barros interpretação Ana Meira, José Russo e Rosário Gonzaga (Cendrev) e Maria João Robalo e Miguel Lança (A Escola da Noite) cenografia João Mendes Ribeiro e Luísa Bebiano figurinos Ana Rosa Assunção desenho de luz António Rebocho

Évora, Teatro Garcia de Resende

19 a 28 de Abril

quarta a sábado, 21h30; domingo, 16h00

Coimbra, Teatro da Cerca de São Bernardo

16 a 27 de Maio

terça a sábado, 21h30; domingos, 16h00

21 de Junho a 1 de Julho

quinta a sábado, 21h30; domingos, 16h00

 

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