Falar em companhias da descentralização tem, simultaneamente um significado histórico, político e artístico. Histórico porque o processo da descentralização – a cujo inicio se associa Mário Barradas e em que, com outras pessoas, também esteve muito envolvido o critico de teatro Carlos Porto – enquanto modelo de intervenção cultural, foi ultrapassado pelo forma como se organiza hoje a actividade cultural, e especificamente teatral fora de Lisboa e Porto (das seis companhias o nascimento de três, Braga, Caldas e Évora está ligado ao modelo da descentralização, enquanto que o aparecimento da Acta, Teatro da Serra de Montemuro e Escola da Noite já pertence a outros contextos). Político, porque o movimento da descentralização se reformulou e incorporou as estratégias de desenvolvimento local no campo da Cultura e – de ler neste domínio os ensaios de Fernando Mora Ramos e de Américo Rodrigues em 4 Ensaios à boca de cena – sendo neste sentido parceiro político (ou para uma política cultural) da comunidade onde se integra. E finalmente artístico por causa da sua programação onde a preocupação de investir numa dramaturgia própria e com maior ligação à comunidade é maior. Veja-se por exemplo: das seis peças, dois são de autores portugueses, Alexandre Honrado e Abel Neves. Há também o mito de Pedro e Inês revisitado por Alexej Schipenko. Das outras peças uma é brasileira (Plínio Marcos) e a outra espanhola (Luis Del Val), ou seja, fora daquilo que que poderíamos chamar o cânone dramático predominante em Portugal. E mesmo Athol Fugard é um autor que pese a sua relevância crescente pela forma interventiva e política com que tempera a sua criação artística, não faz parte de cânone nenhum.
facebook, 2/06/2012
Tags: CULTURBE, Festival das Companhias, Joaquim Paulo Nogueira, política cultural